sexta-feira, dezembro 22, 2006



I.

sim... é natal.

no tal
natal
notas de real.

ruas intransitáveis, lojas abarratodas, engarrafamentos sufocantes.

nos shoppings, velhas senhoras com bolsas coloridas, crianças barulhentas, filas enormes, banheiros cheios de merda...


2.

já podemos ouvir os sinos das renas...

papai noel acorda às 5h, mora em um município da baixada fluminense.

logo cedo pega a kombi lotada para o centro da cidade. lá pega um busum pro centro do Rio. a essa hora o coletivo já está cheio e ele tem de encarar a viagem em pé.

no centro, pega um metrô (igualmente cheio) pra zona sul.

a risada inconfundível de papai noel anuncia sua chegada: rou, rou, rou...

no shopping, veste sua roupa tradicional.

no segundo piso, perto da praça de alimentação, ele faz o seu plantão diário.

e ele fica ali, horas e horas, recebendo criancinhas mimadas da burguesia carioca. bundas e mais bundas sentam no seu colo. moleques escrotos enchem seu saco. madames esnobes dirigem as fotos com autoritarismo: "ô, meu senhor! dá pra ficar mais pra trás! assim não aparece o pedro lucas!".

anoitece e ele não tem noção disso, pois os shoppings são feitos para as pessoas perderem a noção do tempo. não há tempo e a exigência é ficar sempre em movimento. são poucos os locais de parada, de descanso. se há descanso, ele é capitalizado em lucros: na praça de alimentação, pais e filhos sentam seus traseiros roliços e devoram a carne de minhoca do mc'donalds.

no final do dia, papai noel está todo quebrado. vai voltar pra baixada. seu trenó é da ciferal e sua rena se veste com camisa azul de botão e calça de tergal.

rou, rou, rou...

é natal!


C.

pois é... o natal.

paira no ar uma densa neblina de consumismo e futilidade.

símbolos artificialmente transplantados para a realidade local.

o haiti e o pólo norte são aqui.

no cerne de toda a hipócrita ladainha sentimental, o interesse mal disfarçado da indústria, do comércio, das multinacionais.

e o mundo da propaganda vira o local apropriado para as utopias. o mundo feito pelos publicitários é perfeito.

um mundo que não parece tão "utópico", afinal, pois está inserido no nosso velho modo de produção/modo de ser capitalista: não precisamos transformar absolutamente nada!

um mundo em que os bancos não se parecem com bancos; em que celulares são aparelhos indispensáveis à sobrevivência da espécie; em que se vivem "beautiful moments" pagando por caros planos de saúde.

curioso que quando alguns se arriscam a falar de sociedades mais justas (realizáveis mediante a transformação/implosão de um modo de ser/produzir simultaneamente suicida e genocida) são logo taxados de "lunáticos", "cabeças de vento". suas utopias são relegadas ao ridículo, ou embaladas à vácuo para consumo espetacularizado: "é chique ser rebelde".

parece que os revolucionários, os poetas, os filósofos, os que buscam tranformações devem virar publicitários. a publicidade é o lugar da utopia, do sonho, do projeto de sociedade ideal. pois no mundo da publicidade não há miséria, não há favela, não há desigualdade social, não há racismo, não há autoritarismo...

no mundo da publicidade, um banco não é uma instituição historicamente afinada aos interesses de uma elite, disposta a extorquir somas de seus clientes com taxas abusivas, com juros exorbitantes; as empresas de telefonia não estão a todo instante desrespeitando o consumidor, passando por cima de uma fiscalização frouxa e cobrando os olhos da cara para as pessoas se comunicarem; e um plano de saúde não fere um princípio básico que toda sociedade deveria seguir: atendimento médico-hospitalar sendo direito de todos, tudo de graça e com qualidade.

o pior é que o alcance dessa idéias é fenomenal. as pessoas assumem todos esses valores, entoam o hipnótico mantra do consumismo e fazem todo o resto do serviço sem reclamar. nenhum revolucionário conquistou tantos militantes!

é isso, revolucionários! para serem levados a sério, entrem para o mundo da publicidade: o único lugar onde vocês podem sonhar os sonhos mais estapafúrdios e ainda ganhar dinheiro com isso!

rou, rou, rou...


qUATRO.


encerro este post natalino com uma bela canção de natal.

abaixo vai a letra e um link pra quem quiser acompanhar o som/imagens.

é pra cantar com força, com espírito de natal!

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"Papai Noel Velho Batuta"
(Garotos Podres)

PAPAI NOEL filho da puta
Rejeita os miseráveis
Eu quero matá-lo
Aquele porco capitalista
Presenteia os ricos
E cospe nos pobres
Presenteia os ricos
E cospe nos pobres

(repete primeira estrofe)

Mas nós vamos sequestrá–lo
E vamos matá-lo
Por quê?

Aqui não existe natal
Aqui não existe natal
Aqui não existe natal
Aqui não existe natal

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Vídeo

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3 Comments:

Blogger Carrie, a Estranha said...

Oiii!

Belo (anti-)conto de Natal! Q o seu Natal seja muito diferente de tudo isso. Que o seu natal e o seu 2007 sejam o q vc achar q devem ser!

Um beijo grande!

7:48 AM  
Anonymous Anônimo said...

Cara, esta semana mesmo eu pensei nessa música... Na verdade não conseguia lembrar da letra toda, e também confundi a banda (pensei que fosse do Ratos do Porão)... Enfim, troquei a porra toda. De qualquer forma, legal encontrar a letra aqui na íntegra...

10:20 PM  
Anonymous Anônimo said...

beleza, cláudio!
uma música que já virou clássico.
e quem sabe até os ratos já tocaram...
valeu!

9:40 AM  

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