sábado, janeiro 13, 2007

e lá vem aquela velha de novo me encher o saco...

não... não vem pra cá!
mas vem.
uma velha, olheiras enormes, crateras na face gordurosa, crostas de seborréia entre ralos cabelos.
- senh...hmmmm... por...hm,,mm... favô....hmmmm....um trocadin...hmmmmm#### ... $$$... tenho doenç.....ói...ói...
levanta a blusa, mostra as costas, a barriga... cheias de verrugas purulentas...
e eu digo que
não... não tenho... foi mal...
o chiado raivoso do rádio.
sexta-feira quente de verão noite rio avenida rodrigues alvez.
pavuna, madureira, gramacho, belford roxo, piabetá...
o meu não vem.
o meu parece que nunca vem.
genérico da valda, 30 centavos...
bananada açucarada, 10...
vêm trocadoras de ônibus com batom barato, sorrisos cinzas, cigarro-pigarro.
vilar dos teles, xerém, paracambi, sepetiba...
e a porra do meu não vem, nunca vem.
e vem o cachaceiro, catando latas, guimba de cigarro pendendo na boca desdentada, olho amarelado, catarro petrificado no bigode crespo.
e a moça suburbana, calça colada, sobe linda no irajá...
e nada do meu, nada.
nova campina, cabuçu, nilópolis, guadalupe...
e o ar se torna pesado, a vida me esmaga,
as pessoas vêm, as pessoas vão...
e eu me martirizo numa existência crítica sem o meu, que não vem,
e eu não vou, eu estaco, eu paro, e não me movo.
queimados, santa cruz, éden...
o vendedor de bala sobe e vai, a velha com bolsa de mercado sobe vai, o garoto com uniforme de bombeiro sobe e vai...
e eu que não sou nada, que não vou, que não subo, que não sumo, que não vendo balas nem tenho verrugas purulentas nas costas...
coelho neto, nova iguaçu, realengo, marechal hermes...

camelô, camarada, me vê a tal bananada,
guaraná natural, amendoim japonês,
me vê, me vê...

o quê?!

olha o meu! olha o meu!

faz sinal! faz sinal!

putaqueopariu...
pu-ta-que-o-pariu...
passou, passou, passou...

e lá vem aquela velha de novo me encher o saco.


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literapaudura

à tua literatura,
que se quer literapura,
contraponho
minha literadura.
inchada,
cabeçuda,
pero sin perder la ternura.

(da série "micropunhéticas")



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5 Comments:

Blogger Carrie, a Estranha said...

Liiiindo!! Muito bonito! Mesmo.

bj

12:37 PM  
Anonymous Anônimo said...

valeu! ;-)

7:19 AM  
Anonymous Anônimo said...

Bonito nada, isso é a estética do feio, da aflição, da espera, do horror cotidiano das vias do capital.

"Literadura" pura. rs

4:45 PM  
Blogger Fernando Beserra said...

Pura sacanagem.. ai é "duro"! passou direto, meteu no reto.. ai doi.. e espera.. e espera.. é foda! Fóda sem fôda. Além de tudo, ainda tem que pagar, no bom sentido, a pior das passagens... nessas horas só aquela balinho de grátis só pra prova, ou aquele amendoin esperto cai bem

6:59 PM  
Anonymous Anônimo said...

Muito bons, mesmo. Os dois textos.

12:25 PM  

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